Preciosidades de estante: Olhai os Lírios do Campo – Érico Veríssimo.


Autor: Érico Veríssimo
Editora: Globo
289 páginas


A princípio pode parecer um livro de leitura difícil, cheio de rebuscamentos e expressões fundidas para fazerem parte de um enigma. Com o passar das páginas, porém, o leitor percebe a verdadeira mensagem que Érico Veríssimo quis passar com uma das suas mais lindas obras.
A trama é dividida em duas partes, sendo a primeira composta por flashbacks que Eugênio Fortes, protagonista da obra, tem durante uma viagem que faz às pressas para visitar Olívia, um velho amor que conheceu na faculdade de Medicina, que está correndo sérios riscos de vida em uma mesa de hospital. A segunda é o desencadear dos acontecimentos que sucederam àquela visita (ou, mais precisamente, à morte de Olívia).
Durante a viagem até a cidade em que Olívia se encontra, Eugênio se recorda de sua difícil vida de criança pobre, lembrando também da forte imagem que tem de seu pai Ângelo — que, ironicamente, é visto pelo filho como um homem fraco e submisso — e de sua mãe Alzira, crente fiel em Deus.
Além disso, fortes lembranças da sua época de estudante de Medicina acometem sua mente, fazendo-o sofrer ao relembrar os momentos que passou com Oívia —desde o seu inesperado “amor de companhia” até a sua opinião contínua e devota sobre Deus (que contrastava com a de Eugênio, que compartilhava ideais do ateísmo).
Em contrapartida, pensamentos do seu próprio presente também o fazem alimentar uma confusão constante e ininterrupta. Por ambição de ter uma vida melhor, casou-se com uma mulher rica e de grande renome na sociedade. Encontrando-se em tal situação, lembra-se da ocasião em que precisou contar à Olívia que não mais poderiam se encontrar por causa de recém-combinado casamento. Olívia, por sua vez, aceita a situação sem demonstrar revolta. Muda-se para outra cidade e passa a exercer lá a sua profissão de médica.
Apesar de ser uma boa trama, devo confessar que as “páginas de ouro” — pelo menos as que eu assim considerei — poderão ser encontradas apenas na segunda parte do livro.
É na passagem da primeira para a segunda parte que Eugênio lembra da visita inesperada que fez à Olívia, tendo encontrado a mesma mulher sorridente e com argumentos que constantemente citam Deus. Contudo, além de ser recebido por um velho amor, Eugênio é também surpreendido por uma outra pessoa que lhe é apresentada por Olívia: Anamaria, sua filha.
Embasbacado com a notícia de que todo esse tempo fora pai de uma criança que nunca pudera acompanhar, Eugênio, apesar de não aceitar previamente, é aconselhado por Olívia a seguir normalmente com sua vida, não tornando público que teria uma filha fora do casamento.
Com a morte de Olívia, contudo, tudo muda. Eugênio volta à casa em que ela vivia e toma posse de um amontoado de cartas que a mesma escrevera para ele, ainda no período que o mesmo desconhecia a existência da filha. Entre elas, está um texto deixado por ela horas antes de morrer. Demonstrando sempre sua satisfação por ter vivido e sua confiança em Eugênio, Olívia pede que o mesmo cuide de Anamaria – pedido que é imediatamente atendido.
No decorrer da trama, o autor narra a relação de Eugênio e Anamaria, levando em conta também a constante falta que Olívia faz a ambos.
Vale ressaltar que “Olhai os Lírios do Campo” é um livro para ser lido com “ponto de vista” previamente definido. Cada um acha o que quer achar nele. Longe de só falar das desilusões de um homem com amores falecidos, ele também trata de política, religiosidade e traz críticas à sociedade da época.
Érico Veríssimo trouxe nesta obra uma gama imensa de observações a serem feitas. Cabe à cada um aproveitar as mesmas da forma correta.

Citações do livro:
"- Sim. - Pensou Eugênio - o tempo cicatriza todas as feridas. Em breve Dora desapareceria da vida de Filipe, de Isabel e de Simão, assim como a própria Olívia havia de desaparecer de sua vida.
Era doloroso mas inelutável. E Olívia mesmo compreendia isso de maneira profunda quando dizia que a vida começa todos os dias. O mundo seria insuportável se as criaturas tivessem boa memória."


"- A quem o brinde?
- À vida... - sugeriu Eugênio.
Seixas fez uma careta.
- Não bebo à saúde dessa vaca. - respondeu áspero. - Cortei as relações com a vida!"



"Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente." 


Raíssa Muniz
8 de setembro de 2012


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