E ela persiste.


Inconstante. “Meio assim” avessa às demonstrações de afeto, acenos públicos, reconhecimentos fervorosos. Transeunte sempre da calçada contrária. Poucas vezes para, suspira, exibe sinais que viu o dito – e temido – conhecido. Constantemente, porém, segue em frente. Fisicamente, seu corpo se (i)limita a seguir seu próprio rumo, altruísta, poupando grandes desfeitas – que sempre chegam. Mentalmente, os olhos ficam lá. Lembrando de cada resquício deixado. Cada rasgo, cada rompante de personalidade. Cada toque de um quadro que – talvez infelizmente – foi pontilhado, demonstrando a maestria de seus artistas.
E ela segue. Mas talvez por não ter realmente um lugar para ir, retorna. Volta, desbota, estraga. As personagens não são as mesmas – as sensações, tampouco. Os detalhes persistem, inexistentes. Na sua mente, tudo permanece exatamente da mesma maneira. Seus olhos, porém, negligenciam-na ao mostrarem o que realmente ficou. Algumas pinturas, alguns artefatos um pouco mais valiosos. Quadros roubados, papéis destroçados. Outrora tão limpos, tão secos, tão solúveis. Agora, borrões de tinta.
Assombram-na ainda que acordada. Quando tomada pelo irrealismo da noite, cegam-lhe os olhos. Correm, ultrapassam, seguem. Tomam-lhe o sossego, a lucidez. Abre os olhos pela manhã, esvaída.
Segue mais um dia, passa novamente na calçada – sempre contrária –, encontra seus estimados, continua, procura rumos; encontra-os. Chega ao atelier dos quadros borrados, tentando esconder seus suspiros chorosos. Encara as obras que lá sossegam – tão diferentes dela. Perde-se em seus detalhes, suas técnicas, seus pontilhismos. Cega. Adormece silenciosamente, ainda atenta – não fecha os olhos, tampouco. Os quadros retornam, os traços também. Seus artistas, mortos por sinais do tempo, voltam também.
E ela persiste.

Raíssa Muniz – 27 de Julho de 2012.



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